Era hábito perguntar-me, das outras vezes que nos detivemos os dois no hall de entrada, o que eu queria.
- O que queres tu, 'Zelle?, perguntava-me, num tom firme e insistente.
Era raro responder à sua pergunta. Pelo menos em voz alta. Porque, em silêncio, só pensava numa resposta possível.
- Quero-te a ti.
Era
isso que, bem lá no fundo, eu lhe queria responder. (aquela afirmação
curta que, tantas vezes, me tinha dito ele a mim.) Era isso que desejava. Ele.
Só ele. Sem os problemas que me trazia.
A
razão, que sempre tomou conta de mim nas mais variadas situações, não
me deixava verbalizar tal anseio. Acabava, inevitavelmente, por lhe
pedir que saísse pela porta já entreaberta.
Desta última vez, não me fez essa pergunta.
- Tens a certeza que é o que queres?
- Há zero vírgula zero possibilidades de voltares atrás?
Foi isso que me perguntou.
E respondi afirmativamente. Às duas perguntas. Com uma segurança quase assustadora.
Se me tivesse perguntado o que eu queria, nessa última noite, a minha resposta teria sido diferente das anteriores.
- Esquecer-te.
Era isso que eu queria naquele momento. Esquecê-lo. Para sempre. A ele e a tudo o que fez dele o homem da minha vida.
A agilidade, o carinho, o atrevimento daquelas mãos na minha pele.
A beleza daqueles olhos cor-de-saudade que sempre senti mais meus do que dele.
A facilidade em me perceber as manhas e manias e continuar a afirmar, convicto, que era perfeita assim. Tal e qual como sou.
Tudo.
Queria, e ainda quero, esquecer tudo.
Esquecer-me dele,
é o meu maior querer.
(trinta e um de Outubro de dois mil e dezasseis)