quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Petit plaisir délicat*


Eu, que nunca fui uma apaixonada de loiça por lavar, dou por mim a lavá-la com agrado. 
Enquanto passo a esponja cheia de espuma pelos pratos manchados com vestígios de outros prazeres, espero por aquele momento.
Vou tentando estar alerta. Vou tentado estar atenta à sua chegada. Mas uma distraída inveterada nunca deixa de o ser. Não consigo dar por ele a chegar, esse prazer delicado que me leva a lavar loiça com alguma satisfação.
Quando menos o espero, lá está ele. De repente, sinto um abraço apertado. Sinto-te os braços, à volta da minha cintura. Sinto-te as mãos, cruzadas a aconchegarem-me a ti. Sinto-te os lábios no meu pescoço. A tua respiração lenta na minha pele. A tua respiração transformada em beijo. No melhor beijo que se possa receber.
Fecho os olhos e, por instantes, já não há loiça por lavar. Já não há paredes à nossa volta. Já não há gente. Já não há mundo. Só tu e eu. 
Um contra o outro.
Um com o outro. 
Tu e eu.


[19 de Novembro de 2015]




* singela homenagem a Philippe Delerm. Quem pegou o meu livro emprestado que mo devolva. Merci.

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